26 novembro 2006

Guerras por água

Stuart Pimm

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Veja o conflito na bacia do rio Jordão. Em 1990, o rei Hussein declarou que a água era a única questão que o levaria à guerra com Israel. A retórica é recíproca: o antigo ministro da agricultura de Israel, Ben-Meir, disse basicamente a mesma coisa. Não é difícil entender o porquê. Já com seus tamanhos populacionais atuais, Israel, Jordânia e Síria são importadores de cereais. Os três países têm um crescimento populacional explosivo. Israel está tentando abrigar um milhão de imigrantes vindos da antiga União Soviética. A população da Jordânia vai dobrar em 20 anos e a da Síria em 18.


Israel e a Jordânia têm quantidades semelhantes de terras cultivadas (cerca de 4.000 km2) e de população (cerca de 5,5 milhões de habitantes). Israel irriga 42 por cento de suas terras cultivadas, enquanto a Jordânia irriga, com metade do mesmo volume de água, apenas 16 por cento. As expectativas de um maior crescimento econômico da Jordânia teriam um grande impacto no uso da água, mesmo se a população não estivesse crescendo; o consumo de Israel já excede o seu suprimento de água doce renovável.


O sonho palestino de uma Cisjordânia independente já seria difícil o bastante se fosse apenas uma questão de terras, idioma e religião. Cerca de 25 a 40 por cento do abastecimento de água doce de Israel vem de um aqüífero localizado em subsolo da Cisjordânia – as terras ocupadas por Israel após a Guerra de 1967. Durante sua ocupação, Israel tem feito sérias restrições ao volume de água que os árabes da Cisjordânia podem bombear. Todavia, Israel tem sobrecarregado o aqüífero para uso próprio.


Israel também ocupa as Colinas de Golan, uma parte da Síria. O controle dessa área dá a Israel acesso às encostas que drenam água para o rio Yarmük. Esse é o último rio inalterado que deságua no mar da Galiléia, definindo a fronteira entre Síria e Jordânia. O mar da Galiléia é a principal fonte de águas superficiais de Israel e dele parte uma rede de canais e dutos, o aqueduto Kinneret-Negev, levando água para o sul. A Síria e a Jordânia têm planos de represar o Yarmük, em Maqarin. Israel já anunciou que destruirá o reservatório, caso seja construído, temendo que ele reduza o volume de água que Israel pode extrair do mar da Galiléia. O belicoso Comitê dos Moradores de Golan, armado com brochuras em inglês e endereço eletrônico, deixa clara sua posição em relação ao território ocupado: “Não há lugar para negociação territorial... Golan controla 30 por cento dos recursos hídricos de Israel”.


O uso de fertilizantes por Israel é sete vezes maior que o da Jordânia – outra estatística que a Jordânia gostaria de igualar. Todavia, há conseqüências: a água que volta para o rio Jordão depois de ser utilizada na agricultura de Israel já está extremamente poluída por fertilizantes. Há ainda a poluição industrial e urbana. E o bombeamento intensivo do aqüífero costeiro levou a um processo de salinização da água.


Esse é um problema isolado? De jeito nenhum! Sandra Postel, uma cientista do Projeto Global de Políticas Hídricas [Global Water Policy Project], em Massachusetts (EUA), discute essas e outras áreas de conflito em seu excelente e prazeroso livro Last oasis: facing water scarcity. “Índia e Bangladesh brigam pelo rio Ganges”, diz ela, “México e Estados Unidos pelo Colorado, República Tcheca e Hungria pelo Danúbio, Tailândia e Vietnã pelo Mekong”. Oito outros países poderiam controlar o fluxo do Nilo antes de sua entrada no Egito. Assim como o Egito, esses países têm um elevado crescimento populacional. Vários estão entre aqueles países que a FAO considerada como tendo uma “baixa segurança alimentar”. Nenhum deles é famoso por cooperar com os países vizinhos.

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Fonte: Pimm, S. 2005. Terras da Terra. Londrina. Editora Planta.


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