21 junho 2007

As águas da região amazônica

Wolfgang J. Junk

A água é um fator preponderante na paisagem amazônica. Isso pode-se dizer tanto para os majestosos rios, os quais obviamente chamam a atenção dos visitantes, quanto para os inúmeros pequenos rios e igarapés, que contribuem para a formação dos rios gigantes. A rede de igarapés na Amazônia é tão densa como em quase nenhuma região do mundo. Porém, olhando-se de perto, verifica-se que os corpos de água não são uniformes. Encontram-se diferenças consideráveis tanto em relação à morfologia de seus leitos quanto às suas características químicas e biológicas.

Os lagos que acompanham os grandes rios e que são típicos para áreas alagáveis (várzeas e igapós) faltam nas áreas não-inundáveis (terra firme), onde igarapés e pequenos rios caracterizam a paisagem.

Rios com água barrenta ocorrem tanto quanto rios com água preta ou cristalina. Enquanto alguns rios quase não têm correnteza, outros passam por corredeiras e cachoeiras. Rios ricos em nutrientes, plantas, peixes e [aves] aquáticas são tão comuns como rios pobres, onde raramente uma garça agita a tranqüilidade e monotonia da paisagem.

Para entender esta diversidade é necessário não somente descrever os aspectos biológicos das águas amazônicas mas também discutir as condições geográficas, geológicas, hidrológicas e hidroquímicas da região inteira, porque a água e a terra adjacente se influenciam mutuamente e somente em conjunto formam a paisagem amazônica tão característica.
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O turista que faz um passeio de barco para ver o encontro das águas dos rios Solimões e Negro, imediatamente percebe a diferença de cor das águas de ambos os rios. O rio Negro tem sua água transparente e escura, enquanto que a água do Solimões é branca e barrenta.

Nas áreas do encontro das águas, ambos se misturam de uma maneira similar como café e leite. Por causa da coloração, as águas escuras são chamadas águas pretas, enquanto que as águas barrentas são chamadas águas brancas. Na boca do rio Tapajós encontra-se uma área de mistura semelhante, porém a água do Tapajós é transparente e esverdeada. Como [explicar] essas diferenças nítidas na coloração da água?

Água branca
Vários rios da região amazônica, como o próprio Amazonas, Purus, Madeira e Juruá, nascem na região andina e pré-andina. Os processos de erosão nos Andes são muito intensivos e a carga de sedimentos é muito alta, provocando a cor branca das águas. Em áreas de baixa correnteza, os sedimentos são depositados e a transparência da água aumenta, enquanto que em outras áreas a correnteza invade os barrancos recebendo novos materiais para carregar.
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Água preta
Ao contrário dos rios de água branca, o rio Negro e outros rios de água preta (rio Urubu) não transportam material em suspensão em grandes quantidades. Rios de água preta nascem nos escudos arqueados das Guianas e do Brasil Central ou nos sedimentos terciários da bacia amazônica, que tem um relevo suave e pouco movimentado, onde os processos de erosão são pouco intensos e reduzidos ainda pela densa [floresta] pluvial. Conseqüentemente, a carga de sedimentos é baixa e os rios são transparentes.

[E]ncontram-se na sua área de captação enormes florestas inundáveis (igapós) e o material orgânico produzido pelas florestas, tais como folhas, galhos etc., cai na água e decompõe-se. Vários produtos da decomposição são solúveis e de coloração marrom ou avermelhada (ácidos húmicos e fúlvicos), provocando a cor escura da água preta.
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Água clara
Os rios de água clara são transparentes e com cor esverdeada, transportando somente poucos materiais em suspensão. A análise química mostra uma heterogeneidade relativamente grande destes rios e principalmente dos igarapés com relação ao pH e à condutividade elétrica.
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Em resumo, podemos constatar que se pode distinguir na grande variedade de águas amazônicas dois tipos nitidamente diferentes e com caracteres bem específicos: água branca, que é turva, rica em sais minerais dissolvidos, com alta percentagem de cálcio e magnésio, e neutra ou pouco ácida, e água preta, que é transparente, escura, pobre em sais minerais dissolvidos, com alta porcentagem de sódio e potássio e muito ácido. Além disso, existe um grande número de águas transparentes, pouco coloridas, com caráter químico variável, que necessitam de estudos adicionais para sua classificação definitiva.

Junk, W. J. 1983. As águas da região amazônica. In: Salati, E.; Shubart, H. O. R.; Junk, W. & Oliveira, A. E., orgs. Amazônia: desenvolvimento, integração e ecologia. SP & Brasília, Brasiliense & CNPq.

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