15 maio 2009

Bolhas de sabão

Francisco Carvalho

Os homens se divertem com as palavras
como as crianças se divertem com bolhas de sabão.
Ai daquele que põe o coração nas palavras
porque depois vem a perdê-lo
como se perde a identidade da imagem num espelho
partido.
Ai daquele que depositou seu fardo de sonhos
às costas das palavras.
As palavras são como as velas de uma nau que perdesse
a rota da bússola.
Teu coração é um labirinto de palavras
mas as palavras precisam de tuas sensações para existir
e as tuas sensações não são menos abstratas
do que as sete verdades do arco-íris.

Mastigas diariamente as palavras
como se elas fossem um bálsamo para a alma.
As palavras te governam e te configuram
delimitam as fronteiras de tua solidão
os caminhos da eternidade e do adeus.
As palavras assinalam o momento de tua morte
e te ensinam a abrir a porta onde não existe porta.

Fonte: Pinto, J. N. 2004. Os cem melhores poetas brasileiros do século, 2ª edição. SP, Geração Editorial. Poema originalmente publicado em 1982.

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