17 abril 2010

A ponte de Brooklyn

Vladimir Maiakóvski

Solta,
Coolidge,
um grito alegre.
Para o que é bom
não mesquinharei palavras.
Com os elogios
podes ficar rubro
como a bandeira de nosso continente,
embora não sejas senão
United States of America.
Como à igreja vai
o fervoroso crente,
como, simples e severo,
entra o monge na cela,
assim eu,
entre as sombras cinzentas do crepúsculo,
humildemente entro
na ponte de Brooklyn.
Como numa cidade,
entre nuvens de pó,
penetra o vencedor,
atrás de seus canhões
compridos como girafas –
assim eu, cheio de orgulho,
famélico de vida,
subo orgulhoso
pela ponte de Brooklyn.
Como o embevecido pintor
crava a vista,
enamorada e aguda,
na Madona do museu,
assim eu,
debaixo do céu
semeado de estrelas,
contemplo Nova York
através da ponte de Brooklyn.
Nova York,
calorenta e pesada
ao cair da noite,
esqueceu seus pesares
e seus muitos andares
e somente
as almas das casas
aparecem
na clara transparência das janelas.
Até aqui
mal chega
o zumbido dos elevadores,
apenas um doce rumor
revela
os trens que se arrastam, tinindo,
como se
se arrumasse o vasilhame da copa.
Quando lá embaixo,
no rio,
se repartem gigantescos caixões,
dir-se-ia que são,
como torrões de açúcar
e sob a ponte
os mastros passam
do tamanho de cabeças de alfinetes.
Sinto-me orgulhoso
deste quilômetro de aço,
eis aqui vivos
os meus velhos sonhos –
luta das construções
contra os estilos,
cálculo exato
dos parafusos,
do aço.
Se viesse
o fim do mundo,
se o caos
pusesse este planeta
de pernas pro ar,
e só ficasse
esta ponte,
empinada por cima das cinzas finais,
então –
assim como de pequenos ossos
mais finos que agulhas,
renascem
os imensos sáurios
dos museus –
a partir desta ponte,
o geólogos dos séculos,
saberia
reconstruir
os dias presentes.
Dirá:
– Esta pata de aço
unia prados e mares,
daqui
a Europa
se lançava para o Oeste,
perdendo ao vento
as plumas indígenas.
Aquele lado ali
lembra uma máquina –
reflitamos –
braços bastantes
para,
com um pé de aço
pousado em Manhattan,
atrair para si
os lábios de Brooklyn?
Pelos fios
da rede elétrica
sei –
era a época
que se seguiu ao vapor –
aqui
as gentes
já gritavam pelo rádio
aqui,
as gentes
já voavam em avião.
Aqui,
a vida
para uns
era folgança,
e para outros
imenso queixume de fome.
Daqui,
os desempregados
se ativaram de cabeça
no Hudson.
E assim minha tela
se distende,
sem detença,
ao longo da cordoalha sonora
até o pé das estrelas!
Vejo –
aqui,
de pé, esteve Maiakóvski,
de pé,
tecendo poemas,
palavra por palavra.
Contemplo a ponte de Brooklyn
como, pela primeira vez,
um esquimó olha um trem,
grudo-me a ela
como um carrapato à orelha.
Oh! a ponte de Brooklyn
há poucas que a igualem.
Sim...
Isso vale!

Fonte: Maiakóvski. 2006. Vida e poesia. SP, Martin Claret. Poema publicado em livro em 1925.

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