17 junho 2014

A invenção das letras

Jô Amado

O Diário, de Vitória, era, como se dizia na época, um jornal ‘a quente’. A composição era feita por linotipos, à base de chumbo. E os patrões não tinham muito interesse em renovar os tipos porque, àquela época, praticamente já só se trabalhava com a impressão em offset. A escassez de tipos transformava o fechamento de cada edição em uma experiência absolutamente surrealista.

Em geral, éramos o Luzimar e eu que fechávamos a edição. A redação ficava no andar de cima – uma espécie de mezanino – e a oficina, no de baixo. As laudas das matérias eram enviadas por uma engrenagem que funcionava como um mini-elevador. Mandávamos, normalmente, as matérias correspondentes a uma página. Descidas as matérias, passavam-se uns minutos e o Nilson, ou o Alemão, berravam lá de baixo:

Olha, corpo 48, só tem dois ‘a’ em caixa baixa e dois em caixa alta para a capa! Corpo 36, só três ‘e’ em caixa baixa!

E nós tínhamos que inventar títulos com os tipos disponíveis.

Fonte: Amado, J. & Moreira, R. 2004. Palavras. SP, Edição dos Autores.

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