18 outubro 2015

Ó noites infernais da minha vida!

Ó noites infernais da minha vida!
– Desespero e descrença os céus e a terra!
Lá não ouço uma voz que diga – esp’rança;
Não vejo aqui sorrir que diga – amor!

Uma lua cansada sempre e morta
Dormindo pelos cumes das montanhas;
Uma hipérbole bruta, uns pirilampos
Na abóbada celeste pendurados –

Áridos mudos campos misteriosos,
Não vejo a aurora mais do que um semblante
D’escarnio à humanidade, e o feio ocaso
Que os olhos a fechar só lembra a morte!

A terra faz-se em homens – vivos sonhos
Do cérebro dormente: algumas horas
O espectro zumbe; e vai-se desfazendo,
Sonho qual é, que não viveu – sonhava.

Passou-se tudo! os sonhos mais felizes
Todos me abandonaram! Os céus abertos,
Ouvi – eu te amo! – Foi mentira. O inferno
Hoje m’envolve, me envolvendo o amor!

De esperança em esperança corre a vida –
Existir é esperar: porque eu morri
Desde que as velas d’alma erguendo a acaso
O meu canto entoei desta desgraça!

Mar sem praias! – seus ventos me diziam:
Não vês lá no horizonte os verdes cumes
Juntos ao céu? – Andei! fagueiro e ledo:
E tão cansado, e sem chegar mais nunca,

Vi caindo a verdade! Eis porque eu morro:
Vive quem dorme e sonha. À dor me uivando
Eu quis aniquilar minha existência,
Que era fantasma o ser, mentira a vida!

E os ecos delirantes retumbaram
Nest’alma às próprias chamas consumida,
Em vão!... Quero viver – vem, vem, ó noite,
Banhar-me do teu sono! Eu durmo, eu vivo.

Demônio da alma, ceticismo horrendo,
Filosofia cega, oh, vai-te! vaite!
Das opressoras escarnadas garras
Solta-me – aos vabes da obscura crença –

Esquece-te de mim; fechem-se as asas
Sinistras de sombrio noitibó!
Eu quero amar a Deus e amar os homens:
Vai-te, deixa-me em paz – feliz eu sou!

Consumiste minha alma enegrecida;
Tu disseste, que um Deus não me acompanha;
Que é vã fumaça esta alma, que o meu corpo
Em cinzas perderá, passando o vento.

Negaste-me um repouso na amizade;
E nem pude mais crer no amor da virgem:
E murcho e frio me recolho às sombras
Da minha vida a me abraçar co’a morte.

Olhei... os dias meus do sol caindo;
Escutei... os meus lábios estalando
Em maldições ao ser desta existência,
E ao Ser que sobre o sol conta os meus dias!

E eu, que me assentava ao pé da serra,
Vendo as estrelas como ninfas d’oiro
Subindo lá do fundo da corrente,
Começando-se a noite a encher de sombras;

Esperando que a lua atravessasse
No vale, por saudá-la dos dois nomes
“De Ana e de minha mãe” – achei só túmulos:
Pálido o amor, pálida a amizade!

Achei a minha vida ser tão longa
Como o passar da eternidade! Em tanto
Dormia as horas... e nas dores de hoje
Meus dias de depois eu descontei.

Fonte (versos 53-56): Nejar, C. 2011. História da literatura brasileira. SP, Leya. Poema publicado em livro em 1857.

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