29 abril 2017

A greve de massas

Isabel Maria Loureiro

Para [Roxa Luxemburgo], a história da Revolução Russa e a história da greve de massas são a mesma coisa. Entende greve de massas como ação revolucionária, que se manifesta de várias maneiras. Ao descrever as greves de massas na Rússia até 1905 e durante 1905, Rosa Luxemburgo mostra que as mesmas surgiram espontaneamente, que não foram, de maneira nenhuma, desencadeadas pelas organizações. No entanto, não deixa de observar que, apesar disso, por trás das greves encontra-se o trabalho de anos de propaganda da social-democracia. Ou seja, a conhecida interpretação de Rosa Luxemburgo como espontaneísta não passa de estereótipo colado pelo stalinismo para melhor combatê-la. O que ela pretende, ao enfatizar o papel das massas desorganizadas na revolução, é se opor aos dirigentes sindicais alemães, para os quais a organização, de meio, transformara-se em fim do movimento operário. Nesta época, seus ataques ainda não se dirigem contra o partido alemão, apenas contra os sindicatos cuja influência e cujo papel considera nefastos e desmobilizadores. É pois contra esse fetichismo da organização, esse amor da burocracia que ela se volta.
[...]

Passemos agora à leitura de Trotsky, que em muito se assemelha à de Rosa. Ele mostra, por exemplo, como o domingo sangrento [22/1/1905] teve uma influência profunda sobre o proletariado russo, fazendo com que a greve se alastrasse por todo o país, de maneira espontânea, arrastando consigo um milhão de pessoas. “Sem plano determinado, inclusive frequentemente sem formular exigência alguma, interrompendo-se começando de novo, guiado apenas pelo instinto de solidariedade, a greve reinou em todo o país pelo espaço de uns dois meses [...]. Trotsky, assim como Rosa, vê a greve como a grande arma da revolução, comparável a uma força da natureza, a uma avalanche que foge ao controle dos homens e segue infatigavelmente seu caminho: “Todos compreendem ou sentem que [a greve] não age por si mesma, que se limita a cumprir a vontade da revolução que a envia” [...].

Fonte: Loureiro, I. M. 1994. Rosa Luxemburgo e Trotsky: a Revolução Russa de 1905. In: O. Coggiola, org. Trotsky hoje. SP, Ensaio.

27 abril 2017

The old familiar faces

Charles Lamb

I have had playmates, I have had companions,
In my days of childhood, in my joyful school-days,
All, all are gone, the old familiar faces.

I have been laughing, I have been carousing,
Drinking late, sitting late, with my bosom cronies,
All, all are gone, the old familiar faces.

I loved a Love once, fairest among women:
Closed are her doors on me, I must not see her –
All, all are gone, the old familiar faces.

I have a friend, a kinder friend has no man;
Like an ingrate, I left my friend abruptly;
Left him, to muse on the old familiar faces.

Ghost-like I paced round the haunts of my childhood,
Earth seem’d a desert I was bound to traverse,
Seeking to find the old familiar faces.

Friend of my bosom, thou more than a brother,
Why wert not thou born in my father’s dwelling?
So might we talk of the old familiar faces –

How some they have died, and some they have left me,
And some are taken from me; all are departed -
All, all are gone, the old familiar faces.

Fonte (última estrofe): Carpeaux, O. M. 2011. História da literatura ocidental, vol. 3. Brasília, Senado Federal. Poema publicado em livro em 1798.

25 abril 2017

A coisa certa

Anthony Crawforth

[Henry Walter] Bates teve uma filha (Alice) com Sarah Ann Mason (que era analfabeta), a criança nasceu em 2/2/1862 [...]. Não consta o pai na certidão de nascimento e, portanto, quando Sarah deu à luz uma filha ilegítima, não podia contar sequer com a ajuda da família ou dos amigos. Nessas circunstâncias, a mãe frequentemente era forçada a ir embora, desprezada pela família e pelos amigos, mudando-se para um lugar onde não fosse conhecida. HWB, entretanto, fez o que era certo, mudando-se para Londres com Sarah e casando-se com ela, em 15/1/1863 [...].

Fonte: Costa, F. A. P. L. 2017. O evolucionista voador & outros inventores da biologia moderna. Viçosa, Edição do autor.

23 abril 2017

Mágica

Mário Cesariny

É uma estrada no céu silenciosa
um anão sem ninguém que o suspeite
é um braço pregado a uma rosa
um mamilo escorrendo leite

São edénicos anjos expulsos
sonhando quietude e distância
são homens marcados nos pulsos
é uma secreta elegância

São velhos demónios ociosos
fitando o céu bailando ao vento
são gritos rápidos, nervosos
que destroem todo o pensamento

É o frio deserto marinho
operando na escuridão
é o corpo que geme sozinho
é a veia que é coração

São aranhas jovens, pernaltas
arrastando embrulhos para o mar
são altas colunas tão altas
que o chão ameaça estalar

São espadas voantes são vielas
passeios de todos e nenhuns
são grandes rectas paralelas
são grandes silêncios comuns

É uma edição reduzida
das aras da história sagrada
é a técnica mais proibida
da mágica mais procurada

É uma estrada no céu silenciosa
por um domingo extenso e plácido
é um anoitecer cor de rosa
um ar inocente, ácido

Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1956.

21 abril 2017

Elegia

Ribeiro Couto

Que quer o vento?
A cada instante
Este lamento
Passa na porta
Dizendo: abre...

Vento que assusta
Nas horas frias
Na noite feia,
Vindo de longe,
Das ermas praias.

Andam de ronda
Nesse violento
Longo queixume,
As invisíveis
Bocas dos mortos.

Também um dia,
Estando eu morto,
Virei queixar-me
Na tua porta
Virei no vento
Mas não de inverno,
Nas horas frias
Das noites feias.

Virei no vento
Da primavera.
Em tua boca
Serei carícia,
Cheiro de flores
Que estão lá fora
Na noite quente.

Virei no vento...
Direi: acorda...

Fonte (versos 26 e 27): Cunha, C. 1976. Gramática do português contemporâneo, 6ª edição. BH, Editora Bernardo Álvares. Poema publicado em livro em 1943.

19 abril 2017

Estrutura e composição do solo

Paulo Leonel Libardi

Para nossos propósitos, vamos considerar o solo como sendo, simplesmente, um material natural, sólido e poroso. A parte sólida deste material poroso consiste principalmente de partículas minerais e substâncias orgânicas de várias formas e tamanhos, e é chamada de esqueleto, sólidos ou matriz do solo. A parte porosa, isto é, a parte não ocupada pela matriz, consiste de poros interconectados e recebe o nome de espaço poroso ou poros do solo. Solos contendo, na camada superficial de 0 a 0,5 m de profundidade, mais de 85% de matéria mineral são chamados solos minerais, e aqueles contendo mais de 15% de matéria orgânica nesta camada são chamados solos orgânicos. Os poros do solo abrigam, em seu interior, quantidades variáveis de: a) uma solução aquosa de vários eletrólitos (Na+, K+, Ca2+, Mg2+, Cl, NO3, SO32– etc.) e outros componentes, denominada água ou solução no solo; e b) uma solução gasosa, composta principalmente de N2, O2, vapor d’água, CO2 e pequenas quantidades de outros gases, denominada ar no solo.

Fonte: Libardi, P. L. 2005. Dinâmica da água no solo. SP, Edusp.

17 abril 2017

Viejo recuerdo

Eduardo Mora-Anda

Viejo recuerdo:
el sol de los venados.
Oro fresco
y el aire,
todo el aire.

Fonte: Horta, A. B. 2016. Do que é feito o poeta. Brasília, Thesaurus.

15 abril 2017

Mulher sentada


Juan Gris (1887-1927). Mujer sentada. 1917.

Fonte da foto: Wikipedia. ‘Juan Gris’ era o nome artístico de José Victoriano González-Perez.

14 abril 2017

Memórias pré-históricas

Fernando Reinach

Muitas vezes estive em locais tão agradáveis que imaginei poder viver ali por anos. Mas em dois deles não consegui entrender a origem desse sentimento de conforto. Um dos lugares são as ruínas de Mesa Verde, no Arizona. As ruínas estão encravadas em um enorme barranco aproveitando cavernas naturais. A cidade é um terraço estreito na face vertical da montanha. O acesso só é possível por rampas. Dos terraços se observa um vale quase desértico e um pequeno riacho. O local é primitivo, estreito e o acesso a ele é complicado, daí a dificuldade de entender a sensação de conforto. Anos mais tarde visitei ruínas da Idade da Pedra no sul da França. Tive a mesma sensação quando subi até as cavernas localizadas em um despenhadeiro de onde se avista um vale rico em vegetação e entremeado por diversos riachos. Apesar de as cavernas serem menores e o acesso mais difícil, senti o mesmo bem-estar.
[...]

Fonte: Reinach, F. 2010. A longa marcha dos grilos canibais. SP, Companhia das Letras.

13 abril 2017

Dez anos e meio no ar

F. Ponce de León

Ontem, 12/4, o Poesia contra a guerra completou 10 anos e seis meses no ar. Ao fim do expediente de anteontem, o contador instalado no blogue indicava que 314.422 visitas ocorreram ao longo desse período.

Desde o balanço anterior – Cento e vinte e cinco meses no ar – foram publicados aqui pela primeira vez textos dos seguintes autores: Charles A. Triplehorn, Johannes Brahms, Manuel Machado, Mary Agnes Hamilton e Norman F. Jonnson. Além de alguns outros que já haviam sido publicados em meses anteriores.

Cabe ainda registrar a publicação de imagem de obra do seguinte pintor: Noel Ford.

10 abril 2017

Fígaro

Johannes Brahms

Todo número de Fígaro é para mim um assombro; simplesmente não compreendo como qualquer um poderia criar algo de tão perfeito; coisa igual jamais foi feita, nem mesmo por Beethoven.

Fonte: Solman, J. 1991. Mozartiana: Dois séculos de notas, citações e anedotas sobre Wolfgang Amadeus Mozart. RJ, Nova Fronteira.

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